A cidade de um dono só


Por Ricardo Antunes
Exclusivo para o Blog de Jamildo

Há pouco mais de um ano, no fatalístico dia 5 de outubro de 2012, fui algemado e preso por um grupo de policiais do Governo de Pernambuco, pela fantástica, excepcional e inverossímil acusação de tentar "vender" (sic) uma notícia por U$$ 1 milhão de dólares.

Coincidência ou não, era o único jornalista, editor de um blog (leituracritica.com), que criticava , abertamente, a possibilidade de um grupo político controlar ao mesmo tempo o Governo do Estado e a Prefeitura da Capital.

"Do gari ao empresário, todos nós valeremos menos", escrevi. O resultado dessa "mexicanização" da política pernambucana, onde até o PT local virou sublegenda do PSB, está aí para todo mundo vê.

Minha análise não era nada pessoal contra governador e seu então candidato a prefeito Geraldo Júlio (PSB). Ele é competente e tem gente séria em sua equipe. Sabe jogar xadrez. E como todo político também faz gol contra e comete erros. Minha função é aponta-los e nada contra quem escolheu ser seu "vassalo" ou trabalhar honestamente em seu projeto político. Cada uma faz da vida o que quer e a pretensão/obsessão do, hoje, candidato é legítima

Coloco isso apenas para reiterar que minha crítica nada mais era que apenas a antevisão do dissenso entre os partidos da base aliada da presidente Dilma Rousseff; e a previsível perseguição aos que ousam dizer não, delatados e perseguidos como "traidores" da então pré-candidatura presidencial de Eduardo Campos, desde aquela época. Isso começa a ocorrer também no plano local. Aliados de antes ( como o PTB) não podem ousar pensar em administrar o Estado. Sofrem assédio por querer faixa própria, traçar seu destino. Mas que país é esse? perguntaria o observador mal informado.

Tudo que eu disse no meu blog se confirmou. Absolutamente tudo. Noves fora os acordos que antecipei em relação as cartas marcadas das licitações de publicidades que foram abertas no mês passado na Prefeitura do Recife. Por tudo isso, em qualquer lugar que não fosse o Recife ( A Cidade Cruel no dizer de Agamenon Magalhães) deveria ter ganho qualquer prêmio de jornalismo.

Ao contrário, fui trancado numa prisão como castigo, feito "menino treloso" que contou o que não deveria se saber. As cartas estavam postas na mesa.
Após denunciar e comprovar uma série de escândalos envolvendo uma figurinha carimbada do empresariado local terminei pagando um preço caro. Muito caro. Além de preso, torturado e linchado pela rede de comunicação montada por meus algozes em todo o Brasil, permaneci como criminoso, trancado por seis meses no Cotel, presídio de segurança máxima.

O processo não voltava para a juíza. Mas como assim? não voltava, pronto.

Quando voltou, fui solto, como manda a lei.

No dia de minha prisão toda a imprensa pernambucana esteve na coletiva do delegado para ouvir apenas uma versão. A versão "oficial". Foi estranho. Muito estranho. Mas na "Cidade de Um Dono Só", o que é ruim para quem diz “não” ao "Imperador", pode sempre ficar pior.

Preso, não pude contar minha versão. Solto, descobri que tinha sido amordaçado. Isso mesmo. Depois de negado pelo juíza de primeira instancia Catarina Villa Boas, "eles" conseguiram que o desembargador Eurico De Barros Filho do Tribunal de Justiça censurasse meu blog - numa clara afronta aos princípios constitucionais do Estado de Direito. Apenas o blog de Jamildo me deu a possibilidade de contar a minha história mas já era tarde. A tesoura da Censura ardil foi mais rápida. Foi apenas nesse blog também que se leu o histórico voto da juiz Catarina Vila-Nova Alves de Lima, da Sexta Vara Civil de Jaboatão dos Guararapes que recusou a mordaça..............................................................................................................

Impedido de exercer a profissão que escolhi, silenciado em minha própria cidade, sem poder contar a minha verdade, para a alegria dos "poderosos de plantão", não foram poucas as pessoas que me aconselharam a me mudar do Recife para escapar da morte anunciada. Não o fiz, porque quero acompanhar de perto esse injusto e demorado processo. Não existe meia-verdade. O processo policial virou um romance kafkiano.

Lutar contra os poderosos não é tarefa fácil. Fui solto somente no final de fevereiro. De lá para cá tenho sobrevivido às custas dos amigos que se revezam na ajuda material e na força para a superação.

Não satisfeitos em me colocar numa cadeia, os meus algozes continuam sua sanha de tortura para que eu capitule. Para que, de joelhos, me renda.

Eu digo, não e repito: Minha prisão foi política. Minha censura também.

As ameaças contra a minha integridade física continuam. Telefonemas anônimos me acordam de madrugada. Invadem meus e-mails e minha caixa postal. Colocam " prostitutas" para falarem comigo pelo Facebook. Vigiam meus passos, espionam meus telefonemas ,montam novas ciladas. Mas o que querem mais de mim? O que desejam com o terror? o que posso oferecer a mais que não o meu sofrimento para esses sádicos?

As agressões não irão calar a minha voz; a sanha vil e covarde somente me anima e me dá vida. Não posso "morrer", ser "suicidado” "atropelado" ou "cair de bike”. Não me venham com a plantação de "drogas" no meu carro. Todas essas possibilidade, e mais outras 1001, já relatei para a Fenaj, diversas Organizações de Direitos Humanos e Secretaria Especial da Presidência da República.

Sócio da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo, participo do Congresso Internacional dia 12 no Rio de Janeiro. Dia 20, em São Paulo, vou ao o Seminário " Jornalistas Ameaçados", patrocinado pelo Instituto Vladimir Herzog e, depois, sigo para Brasília para uma nova reunião com a Federação Nacional dos Jornalistas e outras entidades que, como a OAB -PE, devem sem manifestar contra essa censura. Minha agenda é pública e não preciso andar com seguranças. Quem deve, soube que está andando. Quanto ironia, hein?

Ao contrário dos que muito supõem não levo carrego qualquer tipo de rancor no coração ou de vingança em minhas mãos.

Não me move o sentimento de revanche.

Apenas espero Justiça.

No país da impunidade, sonho com o dia em que os ricos e os poderosos, também, amargarão a justa prisão. Como acontece com os pobres, os pretos, os sem dinheiro, os sem poder, os que sofrem stalking policial, os perseguidos, os que ousam em nadar contra a corrente, os que resistem a moda e dispensam as verbas oficiais.

No Estado em que a última "onda" é censurar e perseguir, e relembro os versos de Dom Hélder Câmara e escuto longe a sua voz. Tive o privilégio de tê-lo
(quanta pretensão) por três ou quatro tardes no seu refúgio ao me provocar - como fazia a todos que o visitava: "E aí? o que você está fazendo de sua vida?", indagava ele.

Na minha solidão profissional ( entendo os que não podem falar), no meu refúgio existencial ( quanta maldade existe no homem), na solidariedade nos momentos de dor e privação ( ah, como são belos os amigos) ouço longe a voz do "Velho Dom" que um dia escreveu:

"Quanto mais negra a noite, mas carrega em si a madrugada".

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